Charge de Aroeira
Sete perguntas e respostas para entender a descoberta realizada pelo instrumento LIGO
As ondas gravitacionais são vibrações no espaço-tempo, o material do qual é feito o universo. Em 1916, Albert Einstein propôs, em sua Teoria Geral da Relatividade,
que os corpos mais violentos do cosmo liberam parte da sua massa em
forma de energia através dessas ondas. O físico alemão imaginou que não
seria possível detectá-las porque elas se originam muito longe e seriam
imperceptíveis ao chegar à Terra. Nesta quinta-feira, porém, um grupo de pesquisadores divulgou a primeira detecção dessas ondas.
Como as ondas gravitacionais se comportam?
Elas são comparáveis às ondas que se deslocam na superfície de um
lago ou com o som no ar. As ondas gravitacionais distorcem o tempo e o
espaço e, em teoria, viajam à velocidade da luz. Sua passagem pode
modificar a distância entre os planetas, embora muito ligeiramente. Como
explica Kip Thorne, um dos pioneiros na busca por essas ondas, esses
efeitos devem ser especialmente intensos nas proximidades da fonte, onde
são produzidas as “tempestades selvagens” que distorcem o espaço e
aceleram e desaceleram o tempo.
É possível escutar essas ondas?
As frequências de algumas ondas coincidem com as do som, por isso
podem ser traduzidas para serem escutadas em forma de suaves assovios.
De onde vêm?
As explosões estelares de supernovas, os pares de estrelas de
nêutrons e outros eventos produzem ondas gravitacionais que têm mais
energia do que bilhões e bilhões de bombas atômicas. A fusão de dois
buracos negros supermaciços é a mais poderosa fonte dessas ondas, mas
esses fenômenos não são muito frequentes, e, além disso, acontecem a
milhões de anos-luz do Sistema Solar. Quando as ondas atingem nossa
vizinhança, são tão fracas que detectá-las representa um dos maiores
desafios tecnológicos enfrentados pela humanidade.
Esse fenômeno permite saber o que está acontecendo onde até agora não víamos nada – em um buraco negro, por exemplo
Por que são importantes?
Abrem uma nova era na compreensão do universo. Até agora, toda
informação que temos do cosmo (apenas sabemos 5%) é pela luz em seus
diferentes comprimentos de onda: visível, infravermelha, ondas de rádio,
raios-X... As ondas gravitacionais nos dão mais um sentido e permitem
saber o que está acontecendo onde até agora não víamos nada — em um
buraco negro, por exemplo. A intensidade e frequência das ondas permitem
reconstruir o que aconteceu no ponto de origem, se foi causado por uma
estrela ou por um buraco negro, quais as propriedades desses corpos, e
compreender melhor essas tempestades no espaço-tempo mencionadas por
Thorne. Também permitem saber se a Teoria Geral da Relatividade
permanece válida nos intervalos de pressão e gravidade mais intensa que
podem ser concebidos. Detectar essas ondas pela primeira vez é um achado
histórico, que provavelmente receberá um Prêmio Nobel de Física.
O que se observou?
De acordo com o anúncio, o Observatório de Interferometria a Laser de
Ondas Gravitacionais (LIGO), nos EUA, captou as ondas produzidas pela
fusão de dois buracos negros. Seria a primeira vez que ondas
gravitacionais são captadas, e isso ocorre justamente um século depois de Einstein antever sua existência.
Até agora, só havia provas indiretas dessas ondas. Em 1978, Rusell
Hulse e Joseph Taylor demonstraram que um pulsar binário (duas estrelas
orbitando juntas, uma delas um pulsar) estavam alterando ligeiramente
sua órbita devido à liberação de energia em forma de ondas
gravitacionais, numa quantidade idêntica à prevista pela Teoria da
Relatividade. Os dois cientistas receberam o Nobel de Física em 1993 por
esse trabalho. Em 2003, foi confirmado que o mesmo acontece com outra
dupla estelar, neste caso de dois pulsares.
O LIGO é capaz de identificar variações
equivalentes a um décimo de milésimo do diâmetro de um núcleo atômico, a
medição mais precisa já obtida por um instrumento científico
O que é o LIGO?
É um grande instrumento óptico de precisão desenvolvido pelos
institutos tecnológicos da Califórnia (Caltech) e Massachusetts (MIT) e
pela Colaboração Científica LIGO, que tem a participação de
aproximadamente 1.000 cientistas de 15 países, inclusive o Brasil. A
instalação consta de dois detectores a laser com formato de L. Cada
braço desse L tem quatro quilômetros, e há dois detectores idênticos, um
na Louisiana e outro no Estado de Washington, a 3.000 quilômetros um do
outro.
Estes detectores estão desde 2002 procurando ondas gravitacionais. Em
setembro de 2015, começou a funcionar o LIGO Avançado, uma versão
aprimorada do detector que multiplica por 10 a sensibilidade dos braços
de laser e, portanto, a distância à qual podem captar ondas
gravitacionais. Atualmente, é possível detectar alterações nos braços de
laser equivalentes a um décimo de milésimo do diâmetro de um núcleo
atômico, a medição mais precisa já obtida por uma ferramenta científica,
segundo o LIGO.
São necessários pelo menos dois detectores para evitar falsos
positivos causados por qualquer vibração local, como terremotos, tráfego
ou flutuações do próprio laser. Diferentemente desses fatores, uma onda
gravitacional causa uma perturbação exatamente igual na Louisiana ou em
Washington.
O que acontecerá agora?
A busca pelas ondas gravitacionais está apenas começando. Com a
configuração atual, o LIGO pode enxergar a uma distância de
aproximadamente um bilhão de anos-luz da Terra, mas sua equipe já
prepara novas melhorias tecnológicas para aumentar sua sensibilidade.
Além disso, no segundo semestre deste ano deve entrar em funcionamento
uma versão aprimorada do detector europeu VIRGO, semelhante ao LIGO, e a
Agência Espacial Europeia
desenvolve atualmente o LISA, um observatório espacial de ondas
gravitacionais. O LIGO, por sua vez, alcançará sua máxima potência em
2020.
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